sexta-feira, 9 de dezembro de 2016





 O Espírito Santo é o pedagogo dos mistérios da fé cristã
                                                               ( I de II )


O batismo de Jesus Cristo por Gustave Doré
 

           Toda a trajetória do povo de Deus descrita nas Escrituras Sagradas nos mostra sempre a presença d’Ele Deus atuando pessoalmente ou comissionando a outro (s) o papel de mestre e de condutor de seus escolhidos de forma a não sair por atalhos ou desvios de seu caminho e ao mesmo tempo, compreender progressivamente a pessoa de Deus e seu plano tanto para o mundo inteiro, quanto para cada indivíduo.
           Dentre tantos, o texto de [Salmos 32,8_ Eu o instruirei e o ensinarei no caminho que você deve seguir; eu o aconselharei e cuidarei de você.] expressa de maneira clara a atuação de Deus, o Pai como o guia confiável daquele que n’Ele põe a sua fé. Da mesma forma, em todo o Antigo Testamento, há uma rica sequência de textos onde manifestações teofânicas e angelicais, patriarcas, juízes e profetas desempenham a função do magistério revelacional da Palavra de Deus, por trás delas há uma pessoa divina que age em nome das três no sentido de fazer ao ser humano a mensagem inteligível; que a mensagem ultrapasse o linguajar e a expressão inefável e alcance a altura da humanidade.
            Encontramos toda uma riqueza textual que ao contemplarmos de nossa posição atual para o passado, parece-nos que Israel, o povo de Deus, por toda a sua história de erros e acertos e por sua posição privilegiada de guardião dos oráculos divinos de Deus deveria já estar prontamente habilitado para compreender suficientemente a promessa do Messias e acolher ao Cristo com altissonantes louvores a Deus. Por duas razões não foi isso o que ocorreu, a dureza do coração humano em aceitar a orientação de Deus em lugar de sua  autonomia imediatista, porém limitada, e, por fundamentos que o tempo e a sua dimensão nos guardam como mistério. Jesus Cristo no entanto, através de seu sacrifício, mais que preenche o que era abismo de separação entre homem e Deus, ele também rasga o véu de separação entre o espírito humano e o Espírito de Deus ao abrir caminho para o παράκλητος - paráklētos.

 

     Crede-me que estou no Pai, e o Pai, em mim; crede-me, ao menos, por causa das mesmas obras. Na verdade, na verdade vos digo que aquele que crê em mim também fará as obras que eu faço e as fará maiores do que estas, porque eu vou para o meu Pai. E tudo quanto pedirdes em meu nome, eu o farei para que o Pai seja glorificado no Filho. Se pedirdes  alguma coisa em meu nome, eu o farei. Se me amardes, guardareis os meus mandamentos. E eu rogarei ao Pai, e Ele vos dará outro Consolador para que fique convosco para sempre. O Espírito da verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê, nem o conhece; mas vós o conheceis, porque habita convosco e estará em vós. Não vos deixarei órfãos; voltarei para vós. Ainda um pouco, e o mundo não me verá mais, mas vós me vereis; porque eu vivo e vós vivereis. Naquele dia, conhecereis que estou em meu Pai, e vós, em mim, e eu em vós. Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda, este é o que me ama, e aquele que me ama será amado de meu Pai, e eu o amarei e me manifestarei a ele. Disse-lhe Judas (não o Iscariotes): Senhor, de onde vem que te hás de manifestar a nós e não ao mundo? Jesus  respondeu e disse-lhe: Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e meu Pai o amará, e viremos para ele e faremos nele morada. Quem não me ama não guarda as minhas palavras; ora, a palavra que ouvistes não é minha, mas do Pai que me enviou. Tenho-vos dito isso, estando convosco. Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito.   
                                                       João. 14: 11-26

            Jesus Cristo Veio ao mundo e o mundo no entanto,  não experimentou o Emanuel na sua plenitude, poucos (em números relativos) o escutaram e seguiram seu ensinamento. E, mesmo assim, aqueles que se mantiveram dentro do seu círculo mais próximo de amigos deram provas vívidas de que não  haviam de fato o compreendido de maneira real e que despertasse uma fidelidade indissolúvel. Um dos doze dele duvidou até tarde, outro quis tomar a condução de seu  martírio voluntário e irrevogável, um pior, roubava e o traiu entregando-o escandalosamente para a morte. Então, se no ministério do próprio Cristo, reconhecido dignamente como o Mestre dos mestres, ainda encontramos aspectos que mostram a incompletude da função de orientador dos filhos de Deus em Cristo, somos levados (por ele mesmo) a crer que um outro ainda virá em auxílio e para desempenhar de forma definitiva o ápice do mentoriamento sobre seu povo, sobre sua igreja.
             Este Consolador (manto, coberta... supracitado no Evangelho) que vem para o auxílio da igreja e de cada membro em sua individualidade, é o Espírito Santo,   que vem em nome de Jesus, ou seja,  que vem como emissário de Jesus Cristo assim como  Jesus veio em nome de Deus, seu Pai, como emissário de seu Pai como se verifica em v.c. 5, 43 e 10, 25. // D. A. Carson em seu comentário ao Evangelho de João argumenta acertadamente a primeira função do Espírito Santo (depois de Jesus ser glorificado) era lembrar aos discípulos do seu ensino, e assim, ajudá-los a entender seu significado e ensinar a eles o que ele queria dizer. Exemplos desta ação podem ser conferidos em v.c  2, 19-22; 12, 16; cf. 20, 9. Carson afirma que esta promessa e função aplica-se para os cristãos-testemunhas do primeiro século, em particular os discípulos do Senhor, não querendo dizer necessariamente seriam reensinados pelo Espírito, mas  que o Espírito preencheria a revelação trazida por Jesus, fazendo com que eles alcançassem um correto e pleno entendimento da verdade de Jesus Cristo.
            Desta forma, (pela leitura do texto destacado e por esta compreensão) sabemos que existe uma união harmônica e indissolúvel dentro da trindade; que Deus através de suas três pessoas reais elaborou um plano onde cada uma delas desempenha um papel histórico mais proeminente sem que isso signifique o silêncio das demais; que o Pai é autor e consumador de toda a vida, dos tempos e da eternidade; que Ele escreveu uma história onde nós os que n’Ele cremos não somos poupados das dores do mundo, nem privados dos sabores da vida pelo fato de termos sido alcançados por sua graça, manifesta no Cristo. Mas que para Ele e sob a proteção d’Ele caminhamos para a sua glória. A vitória final está consagrada.///  Aprendemos que Jesus o Cristo é o Emanuel, o mestre que pelo ensino e pelo exemplo nos tomou irresistivelmente para Ele e n’Ele aprendemos a mais bela história até onde nossa mente e fé pode nos levar. E por fim, aprendemos que o Espírito Santo veio como o filtro e o intérprete da mensagem de Jesus aos nossos ouvidos, revelando-nos questões que não entenderíamos através do uso de nossas faculdades e ciências, e ainda, dilatando o nosso espírito e coração e aumentando a nossa fé.
                   O milagre das diversas línguas (ou glossolalia) é um evento extremamente significativo da atuação do Espírito Santo sobre o homem a quem Deus chama definitivamente para si. Os discípulos então cheios do Espírito Santo começaram a falar as ‘maravilhas de Deus’ e de forma sobrenatural a grande multidão de judeus que ali se encontravam em razão da festa do Pentecostes, passou a entender-lhes cada um conforme sua língua nativa. As aparentes “línguas de fogo” que pousaram sobre os apóstolos certamente efetuaram neles um milagre que nos lembra as palavras de João Batista (Lucas. 3, 16) e o batismo de juízo e purificação, mas, logo a seguir, ocorre um milagre de proporções muito maiores: o processo de entendimento da mensagem por parte da grande multidão representa a ação do Espírito Santo como intérprete, o milagre ocorre sobre a audiência* que ouve e entende a Palavra anunciada pelos discípulos/apóstolos. Isto nos ensina também que em todas as vezes que este dom se repete (para quem crer em sua atualidade) se faz necessária a presença do intérprete.  
                    O Espírito Santo também fala para Deus o que nós não conseguimos fazê-lo de maneira correta ou inteligível e transforma nossa fraqueza (ou enfermidade) e incapacidade em oração que agrada a Deus. O Espírito Intercede por nós de maneiras inefáveis quando não conseguimos sequer articular sons conexos para Deus  como se eles fossem uma oração em um idioma estranho, o Espírito Santo leva-a a Deus e Ele entende a intenção do Espírito e  alcança para nós favor e a alegria de Deus (Romanos. 8, 26 e 27).
                   Há um texto escrito em linguagem poética, de  James Montgomery que expressa muito bem esse agir específico do Espírito:  
            “A oração é desejo da alma,
            quer expresso, quer não;                                                        
           movimento de chamas ocultas,
          que no peito estremecem.

         A oração fardo é de um suspiro,
        o cair de uma lágrima,
       o relance do olhar para o alto,
      quando só Deus está perto.” 





*Esta afirmação não se refere ao ordenamento mecânico do milagre das línguas,  é apenas uma construção literária.